quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

A História do Trabalho: do princípio aos dias atuais

Escrito e enviado por: Rafael Nunes Carvalho

I. Introdução

Desde o início da história da humanidade sobre a Terra, o trabalho está integralmente ligado à nossa vida.

Ao longo dos anos, a humanidade se adaptou a diversos tipos e modalidades laborais, seja para manter sua sobrevivência no período PRIMITIVO, e posteriormente com os períodos do trabalho ESCRAVO, FEUDAL e CAPITALISTA.

O trabalho e o modo de produção, em seu determinado período, modificou a história da humanidade em vários aspectos, como na personalidade sentimental e intelectual, na psicologia, na religião, na economia, e obviamente, modificou os parâmetros das sociedades até os dias atuais.

Para muitos o trabalho é a relação entre o homem e a natureza, como sabiamente analisou Karl Marx:

“O trabalho, antes de tudo, é um ato que se passa entre o homem e a natureza. Nesse ato, o próprio homem representa, em relação à natureza, o papel de uma potência natural. As forças de que o seu corpo é dotado, braços e pernas, cabeça e mãos, eles as põe em movimento a fim de assimilar matérias, dando-lhes uma forma útil à sua vida. Ao mesmo tempo que age, por esse movimento, pela natureza exterior e a modifica, modifica a sua própria natureza e desenvolve faculdades que nela dormitavam.” (Marx, O capital, Paris, 1948).

Essa interação entre o homem e o meio, pode trazer uma resposta válida para o problema que permaneceu obscuro, tão estudado por Durkheim, na dinâmica social.

As atividades laborais, no decorrer dos anos, passaram de uma questão de sobrevivência à uma questão de honra.

Na maioria das sociedades aquele que não adere a alguma atividade, passa a ser mal visto pelos demais.

Não obstante, sabemos que apesar de o trabalho lhe trazer sustento, acaba muitas vezes invadindo a vida pessoal e familiar das pessoas e ocupando até mesmo o seu tempo livre. Sabemos, também, que as atividades do trabalho tem uma certa ambivalência, que vai desde a insatisfação, tristeza e neurose, até a auto-realização, satisfação e (em raros casos) a alegria.

II. O INÍCIO

Gênesis 3:16 – “E à mulher disse: Multiplicarei sobremaneira tuas DORES em tua gravidez; COM DOR, dará à luz filhos...”

Gênesis 3:19 – “Com o SUOR DE TEU ROSTO, comerás o pão até que tornes à terra...”

Como vemos, desde o início da história da humanidade sobre a terra, representado aqui pelo Livro de Gênesis, o trabalho mesmo sendo concebido como um castigo, está integralmente relacionado ao homem.

As passagens supracitadas, mencionam o momento que seria da descoberta feita pelo homem do conhecimento do bem e do mal, e por isso Deus os “castiga”.

Para a mulher, a dor do parto; ao homem o dever de trabalhar para que pudesse se alimentar a partir daquele momento.

Desde então, o trabalho está intrínseco a vida do homem e não há como separá-los.

Quem nunca ouviu aquela expressão: A mulher entrou em “trabalho de parto”?

Isso quer dizer que NÓS NASCEMOS DO TRABALHO.

Este “trabalho de parto”, se refere a uma condição de dificuldade, nada agradável e dolorosa da mulher.

Isso porque a origem da palavra trabalho, teria vindo do latim tripalium, (antigo instrumento de três pontas usado em tortura e açoites), e do latim vulgar tripaliare, significando torturar.

Sociologicamente falando, sabemos que o trabalho sempre foi assim, pois tínhamos que o trabalho era “coisa” de escravos, e que estes deveriam pagar o seu sustento com o “suor de seus rostos”.

III. Regimes

Regime de trabalho PRIMITIVO:

O primeiro regime de trabalho foi o chamado Primitivo.

Adotado pelas comunidades primitivas. Elas tinham o intuito de se alimentar, se abrigar e combater os inimigos. Daí surgiram as primeiras ferramentas como pedras, espinhos e lascas de árvores. Temos, então, o trabalho como um fator individual de conquista e um fator social de cooperação e interação na busca pelos mesmos ideais.

Não havia excedentes e nem o acúmulo de riquezas, o trabalho era apenas para a sua sobrevivência.

(Nos dias de hoje, se formos até o centro da Amazônia veremos tribos de índios que trabalham e se alimentam apenas da natureza. Colhem, caçam, pescam e não há excedentes, o que sobra é jogado de volta no rio ou é queimado, as vezes deixando clareiras abertas no meio da mata.)

Posteriormente, essas comunidades que só se alimentavam, começaram a praticar a agricultura e o estoque de alimentos. Surge, então, novas formas de interação e o começo da hierarquia.

Regime de trabalho ESCRAVO:

COMTE entendia que a escravidão além de “radicalmente indispensável à economia social da antiguidade”, constituía um imenso progresso..., posto que sucedeu à antropofagia (espécie de canibalismo) ou à imolação dos prisioneiros”. (apud Manoel Alonso Olea, em introdução ao Direito do Trabalho”, Gênesis, pág.145).

O escravo era considerado apenas uma coisa, não era considerado sujeito de direito, era propriedade do dominus. Recebiam apenas o necessário para sobreviver, e o seu dono, proprietário da terra, tinha a certeza de que ele subsistiria fisicamente, e aumentava cada vez mais a sua renda. Os escravos não ficavam com absolutamente nada do que produziam, tudo ia para as mãos dos seus donos.

Na sociedade greco-romana, a escravidão era fundamental para manter os cidadãos comuns longe do trabalho braçal e se preocupar apenas com assuntos que proporcionariam o bem-estar da sociedade e no século I, a. C. a terça parte da Grécia e de Roma era formada por escravos.

Os escravos faziam o trabalho duro, enquanto os outros poderiam ser livres.

Com o fim do império romano no Ocidente a escravidão perdeu sua força pois não era mais viável social e economicamente.

A igreja medieval surge como grande controladora econômica, política e social, o campo ganhou força e surgiu o feudalismo.

Regime de trabalho FEUDAL:

O trabalho Feudal ou servil, foi uma derivação do trabalho escravo, mudou apenas quem os dominava, pois antes o senhor dominava o escravo, agora o trabalhador é servo da gleba.

A passagem da escravidão para a servidão foi lenta e racional. O servo deixou de ser “coisa” e passou a ser visto como pessoa, onde aquela relação de domínio acabou se enfraquecendo.

Porém os servos não eram livres e tinham que prestar serviços ao senhor feudal e em troca ganhavam proteção militar e política, e ainda tinham que entregar parte do que produziam no campo em troca de proteção e do uso da terra.

A religião teve fundamental importância nessa transição. Através do Cristianismo passou-se a respeitar mais a individualidade do ser humano com a concepção humanística romana.

Nessa época, ainda, o trabalho era considerado um castigo e os nobres não trabalhavam.

Um pouco de liberdade para o trabalhador, surgiu com as corporações de ofício, porém ainda nessa fase prevaleciam mais os interesses das corporações do que a proteção dos trabalhadores.

Logo após a Revolução Francesa (1789), houve na França o início de liberdade contratual e retirou-se, de vez, as corporações de ofício.

Os senhores começaram a ir para o Oriente e de lá traziam mercadorias de sua preferência e comercializavam em volta de seus palácios. Surgindo então, a primeira força do capitalismo.

Regime de trabalho CAPITALISTA:

Sabendo que o capitalismo passou por três fases, sendo elas, o capitalismo comercial, industrial e financeiro, falaremos aqui apenas do segundo, que é o capitalismo industrial.

O Capitalismo industrial teve início na Europa, com a crise do Feudalismo e a migração do centro econômico e político do feudo para a cidade. No tocante ao trabalho o que predomina é o assalariado, e na questão sociológica há uma grande divisão de classes. Portanto o Capitalismo é marcado por uma desigualdade social.

Para falar da do Sistema Capitalista é impossível não falar de Karl Marx e Max Webber.

Marx –em O Capital - criticou o Capitalismo e tratou da diferença de classes, alienação, valor do trabalho, os modos de produção e a Mais - Valia, que é a diferença entre o que o trabalhador produz e o que ele recebe.

Webber, ao contrário, defendia o Capitalismo, e absolve a riqueza dizendo que a obtenção de lucros é um sinal de que “seríamos abençoados” por Deus, na obra A ética Protestante e o Espírito do Capitalismo.

Cabe ressaltar, que apesar de ser o regime que mais gerou meios e formas de trabalho para a sociedade, o Capitalismo trouxe como ônus ao trabalhador a alienação, e como consequência, a separação do trabalhador do que ele produz, das máquinas, das terras, da matéria-prima. Para não ser alienado, o trabalho precisa respeitar as aptidões técnicas, físicas e psicológicas do ser humano para que tal tarefa não se torne uma exploração e acabe por lhe degradar e alterar a sua personalidade.

Contudo, o que vemos é que novamente o trabalhador passou a ser uma mercadoria, que apenas produz dinheiro e mais mercadoria para o seu chefe.

O sistema Capitalista na era industrial - sobretudo após o paradigma do modelo taylorista/fordista com a “organização científica do trabalho” - otimizou o sistema de produção porém contribuiu para a alienação do trabalhador, causando muitas vezes a chamada LER (Lesão por Esforço Repetitivo). O sistema capitalista visa apenas o lucro da empresa, que paga ao trabalhador muitas vezes baixos salários, sendo estes, apenas para sua sobrevivência e muitas vezes obrigando o trabalhador a fazer o chamado “bico”, para que se tenha uma renda extra.

O sociólogo André Gorz, fala na dependência do trabalhador e diz que na era industrial, não sobra nenhuma parte da vida do trabalhador que não seja interesse da empresa, que utiliza da sua capacidade física e psíquica e intelectual.

No sistema capitalista de trabalho, também há uma diminuição da divisa entre o tempo dedicado ao trabalho e o tempo dedicado a família, resultando no que chamamos atualmente de workaholics, que se dedicam exaustivamente pela causa da sua empresa.

Sabemos que existe tanto o direito ao trabalho quanto o direito ao lazer, e isso é fundamental para o ser humano, por isso, após muita luta, as 24 horas do dia foram subdivididas em 8 horas para o trabalho, 8 horas para o descanso e 8 horas para o lazer.

Pós-Modernidade:

Vivemos, hoje, na chamada pós-modernidade, com alto índice de desemprego e diminuição do emprego formal e aumento dos trabalhadores autônomos. Há uma preocupação, pois saímos da certeza do trabalho da era do capitalismo industrial e entramos na incerteza do trabalho flexível, autônomo, onde aparece a figura do freelancer, para tentar amenizar as mazelas do desemprego.

Diante desse contexto, surgiram novos pensadores do trabalho, como Domenico de Masi, buscando alternativas a este status quo do trabalhador. Devido o modelo Ocidental focado na idolatria do trabalho, (sobretudo nos Estados Unidos) e o grande avanço do desemprego da atualidade, Masi, insatisfeito, sugere um novo rumo para a sociedade com a satisfação pessoal baseada no tripé: trabalho, estudo e lazer, sugerindo, assim, o que pode vir a ser a sociedade pós-industrial.

Estes sociólogos perceberam que a atual situação do emprego, tende cada vez mais para uma redução da jornada de trabalho seja pela diminuição da demanda, pelo avanço tecnológico, ou em benefício do descanso e do lazer, até chegarmos ao ócio criativo, idealizado por Domenico de Masi:

“A plenitude da atividade humana é alcançada somente quando nela coincidem, se acumulam, se exaltam e se mesclam o trabalho, o estudo e o jogo; isto é, quando nós trabalhamos, aprendemos e nos divertimos, tudo ao mesmo tempo. (...) É o que eu chamo de 'ócio criativo', uma situação que, segundo eu [penso], se tornará cada vez mais difundida no futuro.” (O Ócio Criativo, 2000: p.148)

IV. Conclusão

Atualmente no direito, vivemos o Pós-positivismo jurídico, onde apenas o positivismo já não é mais suficiente. Por exemplo, para solução de casos difíceis (hard cases), como a legalização de pequenas drogas, aborto de anencéfalos, união homoafetiva, privacidade ou liberdade de imprensa, como no caso do cantor Roberto Carlos; os juízes usam cada vez mais o elemento subjetivo da analogia, costumes e princípios gerais do direito.

No trabalho temos a Pós-industrialização, com o avanço tecnológico e cibernético, com os microcomputadores ocupando cada vez mais o lugar dos trabalhadores. Smartphones, tablets, chips (micro e nano), e atualmente o mais novo local para armazenamento de dados, a chamada tecnologia em “nuvem”, (alguém sabe onde está a tal nuvem?). Esses avanços acabam as vezes até assustando algumas pessoas.

Vivemos, também, a época do trabalho parcial, temporário, precário, subcontratado, “terceirizado” etc. (Antunes, 2006: p.47)

Tudo isso ocorrendo junto com o avanço do desemprego.

Por fim, na área da sociologia vivemos a chamada Pós-modernidade. Com uma sociedade de “hiperconsumo”, onde se vale mais o que você “tem” do que você “é”.

O filósofo francês Gilles Lipovétsky usa o termo “hipermodernidade”, para dizer que nos tempos modernos se utiliza muito do individualismo, do consumismo e da ética hedonista (que é a busca incessante do prazer).

Quem tratou muito bem da superficialidade nas relações interpessoais foi o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, nos livros Modernidade Líquida, Vida Líquida e Amor Líquido; tratando também do consumo, do gozo e da artificialidade.

- embora para Bauman não haja uma ruptura de época, e sim, uma continuação da modernidade.

Certamente isso nos traz grande incerteza em relação ao futuro.

Pois tanto na área do direito, na área do trabalho e principalmente na área da sociologia, queremos avançar rapidamente, porém não se sabe para onde queremos ir.

Segundo Engels (1876: p.4) o trabalho é a condição básica e essencial de toda a vida humana. É, em tal grau e, em certo ponto, podemos afirmar que o trabalho criou o próprio homem.


REFERÊNCIAS

ALONSO OLEA, Manuel. Introdução ao direito do trabalho. Tradução de Carlos Alberto Barata Silva em colaboração com Darci Rodrigues de Oliveira Santana. 4. ed. rev. São Paulo: LTr, 1984.

ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho: Ensaios sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 11ª Edição. Editora Cortez, 2006.

ENGELS, Friedrich. Sobre o papel do trabalho na transformação do macaco em homem. 1876.

GORZ, André. Adeus ao proletariado: para além do socialismo. Rio de Janeiro, Forense. 1982.

MARX, Karl. O Capital. Vol. 2, São Paulo, Nova Cultural, 1988.

MASI, Domenico de. O Futuro do Trabalho – Fadiga e ócio na Sociedade Pós Industrial. UNB e José Olympio, Rio de Janeiro. 2000.

WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo. Editora Martin Claret: 2002.

Nenhum comentário: