terça-feira, 1 de dezembro de 2015

O reflexo de 434 mortos e desaparecidos na literatura de Chico Buarque

Escrito e enviado por: Héryta Araújo

A Comissão Nacional da Verdade foi instalada em 2012 (Lei 12.528/2011), dela resultou o documento entregue à Presidente Dilma. Nele, resta comprovado os diversos ataques que os direitos humanos sofreram durante o período da Ditadura Militar.

A invasão de residências a procura de provas de envolvimento em ações subversivas, prisões arbitrárias e execuções, ações hoje inconcebíveis, ou pelo menos não amparadas em lei, eram rotina durante o período Militar.

“Essa comprovação decorreu da apuração dos fatos que se encontram detalhadamente descritos no relatório, nos quais está perfeitamente configurada a prática sistemática de detenções ilegais e arbitrárias e de tortura, assim como o cometimento de execuções, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres por agentes do Estado brasileiro.”

Muito é escrito pelos historiadores acerca desse período, porém, é na literatura que as histórias de personagens fictícios ou não ganham capacidade de ganhar reflexos na história daqueles que não viveram a história. A literatura nos presenteia com a imaginação, capaz de tornar verdadeiro um sentimento que não foi vivido.

Em O irmão Alemão, quinto romance de Chico Buarque, e, para muitos, considerada uma auto-ficção, narra a história de Francisco Hollander, Ciccio, em busca de seu meio irmão alemão. O que do livro trataremos são os trechos referentes ao desaparecimento do seu amigo de infância, Ariosto e, mas tarde, do irmão brasileiro de Ciccio, o Mimmo.

Ariosto Fortunato é amigo de Ciccio de longa data, segundo os relatos de sua mãe, Eleonora Fortunato, artista plástica reconhecida do cenário, ele foi arrastado de casa por policiais a paisana. Ariosto de envolveu com ideias esquerdistas. Nunca mais foi visto e sua mãe, apesar dos esforços ao acionar figuras publicas e de certa influência como, o arcebispo, políticos e industriais, acabou desfalecendo em vida, por não obter notícias de seu filho. Essa narrativa nos remete ao caso real de Zuzu Angel, estilista de renome internacional, cujo filho Stuart Edgart Angel Jones, foi oficialmente dado como desaparecido. Zuzu busca sua influência no mundo da a fim de saber o paradeiro do filho. Depois de anos de busca, Zuzu acaba morta em um misterioso acidente. Em 1998, a Comissão Especial dos Desaparecidos Políticos julgou o caso sob número de processo 237/96 e reconheceu a ditadura militar como responsável pela morte da estilista. Toda a narrativa do caso Zuzu Angel foi tema do filme lançado em Em 2006, cujo título carrega seu nome.

Mimmo, Domingos Hollander, que nada sabia da política, nem com ela se envolvia ou dela tecia discursos foi dado como desaparecido. Acontece que Ariosto tinha uma namorada, Tricita, uma argentina que vem ao Brasil em busca de notícias. Ela trazida por Eleonora Fortunato para passar a noite na casa dos Hollander. No dia seguinte, incumbida de entregar alguns presentes a amigos, ela sai na companhia de Mimmo, que ofereceu-se para guia-la pela cidade. Eles não retornam no dia seguinte e quando a campainha toda, quatro inspetores de polícia invadem a casa em busca de informações que possam levá-los a Beatriz Alessandrini, Tricita. Levam livros, documentos e tudo mais que lhes pareça suspeito.

Tricita e Mimmo nunca mais foram vistos, e deles não se teve notícias. Apesar dos contatos do pai, Sergio Hollander, com políticos e jornalista, a única coisa a retornar foram os livros e documentos devolvidos pelo Ministro, com um pedido de desculpas.

A literatura traz a realidade de aproximadamente 434 mortes e desaparecimentos de vítimas da ditadura militar no país, os dados constam do relatório elaborado pela Comissão Nacional da Verdade.

Grande parte dessa realidade só foi possível com a promulgação do Ato Institucional nº 5 de 1968 . Lei, em sentido amplo, emanada do Estado que o resguardava em toda atividade violenta que se justificasse pela proteção do Estado contra os subversivos comunistas:

Art. 10 - Fica suspensa a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular.
Art. 11 - Excluem-se de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato institucional e seus Atos Complementares, bem como os respectivos efeitos.

A tão sonhada liberdade e o dever do Estado de nela não interferir fora dos limites dados pelo próprio cidadão por meio das leis são conceitos já consagrados desde a Revolução Francesa, em 1789. O que aconteceu ao Brasil de 1964 a 1985 foi um retrocesso que deixou marcas reais no cidadão e na maneira como hoje entendemos o Estado.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Ato Institucional n° 5 de 13 de Dezembro de 1968. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-05-68.htm>. Acesso em: 23.11.2015.

BUARQUE. Chico. O irmão Alemão. São Paulo: Companhia das Letras. 2014.

LIMA, Wilson. Comissão da Verdade confirma 434 mortes e desaparecimentos na ditadura. 2014. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2014-12-10/comissao-da-verdade-confirma-434-mortes-e-desaparecimentos-na-ditadura.html>. Acesso em: 23.11.2015.

WIKIPÉDIA. Zuzu Angel. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Zuzu_Angel>. Acesso em: 23.11.2015.

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